Publicado no site da exposição “GIL70” (www.gil70.com.br, concepção e direção de André Vallias), de 2012
Em maio de 2012, Gilberto Gil deu ao Museu da Imagem e do Som, do Rio de Janeiro, um daqueles depoimentos para a posteridade que os grandes nomes que fizeram e fazem a história da música brasileira vêm dando ao museu desde a sua fundação, nos anos 60. Ao lado de Jorge Mautner, Hermano Vianna e Marcelo Froes, eu participei do grupo de entrevistadores. Foi quando, entre muitas coisas, Gil falou sobre o que chamou de o seu tipo de paixão: a “paixão pela compaixão”.
Em sua homenagem eu imaginei compor essa série de mesósticos que seguem, trazendo os mais diversos exemplos desse sentimento em suas letras. Pílulas de compaixão colhidas ao longo de sua obra, dos tempos iniciais aos recentes, aqui reconstituídas livremente numa nova sequência e numa nova lógica poética, constituindo-se os oito mesósticos resultantes num mosaico músico-poético inspirado numa forma inventada pelo músicopoeta John Cage.
Com ela Cage homenageou alguns colegas compositores como Conlon Nancarrow, e com ela foi homenageado por Augusto de Campos, o mais músico de nossos poetas hoje, que assim definiu: “mesóstico, na prática de Cage, é um acróstico em vertial intermediária, no qual se inscreve um tema ou um nome recorrente, que é atravessado pelo texto”.
meu amiGo
meu heróI
meu amado, minha Luz
descansa a tua mão cansada soBre a minha
sobrE a minha mão
no quaRto do meu coração
no canTo
esperO
aGasalhar-te à
I-
Lusão
meu amiGo, como dói
saber que a tI também corrói
a dor da soLidão
eu sei a Barra de viver
deus sabE a minha confissão
dRão
Tenho que me achar medonho
e apesar de um mal tamanhO
aleGrar meu coração
(se eu quIser
faLar com deus)
ó, mundo tão desiGual
tudo é tão desIgual
de um Lado este carnaval
(Beleza)
do outro, a fomE total
(nossa desgRaça à luz)
eu sei, você sabe, ele sim sabe Também
o que é sofrer O que é chorar
o que é precisar de alGuém
quem nunca precIsou
de aL-
Guém
aInda está pra nascer
uma estreLa no céu
eu sei e você saBe
se não sabE, há de saber
ajudaR aquela dor
a enconTrar
O seu
luGar
no meIo do chororô
a Luz na escuridão
e o laGo
tranqüI-
Lo da mente
ao balBuciar sua oração
mEu amado
iRmão
eu pensei em mim, eu pensei em Ti
eu chOrei por nós
por todo sanGue derramado
todo Irmão chicoteado
todo animaL
de sanGue quente
atacado a sangue frIo
afinaL
meu Bem
há de havEr mais compaixão
não despedace o coRação
Tenho pena de quem chora
de quem chOra tenho dó
loGo
dIgo
o lume das estreLas te alumiará
meu amiGo
eu cá me ponho a medItar
peLa mania da compreensão
quem puder ser Bom que seja
ondE você mora
mora o meu coRação
quando você chora, chora Tudo que é olho
da minha sOlidão
láGrima a correr
pelo cantInho
do oLhar
cada coisa em seu luGar
as flores caÍram no chão
quando eLa chorava, eu dizia
(Baixinho):
“tá cErto, maria
você tem Razão”
pessoa nefasTa, praga
que se arrasta tão baixO no chão
que tu, que a tua bruxa e a tua estranha saGa
– estou pedIndo a deus –
escapem pela Luz do coração