Publicado na“Folha de S.Paulo” em 12/4/1989, sob o título “Letras reúnem o clássico e o pop”
Na história da música popular desempenha um papel fundamental a produção dos principais compositores de canções norte-americanos dos anos 30 e 40, como George e Ira Gershwin, Rodgers e Hart, Irving Berlin, Cole Porter, Johnny Mercer. São eles os Bachs, os Beethovens, os Mozarts, os clássicos autores dos grandes clássicos do gênero. Nesta constelação, um lugar especial cabe a Cole Porter.
Graças ao seu estilo e à sua técnica de ajustar letras elaboradas a melodias relativamente (embora nem sempre) simples, Porter elevou o nível do texto da canção popular a uma alta potência poética, alcançando ele próprio como letrista um grau de sofisticada criatividade em momentos comparável mesmo ao de poetas da área erudita.
Quem quiser provar isso na prática, pode tentar verter algumas canções suas que impõem desafios que só poemas eruditos impõem. Nelas, sem prejuízo da naturalidade, Porter usa recursos que as tornam ainda mais agradáveis à medida que reouvidas: rimas imprevistas, internas, polifônicas; construções ele¬gantes, trocadilhos, enumerações, ambiguidades, paronomásias requintadas e imagens ricas, em temas amorosos tratados com charme e inteligência.
Da supermoderna obra-prima pop “You’re the Top” (uma das maiores – 135 versos mais a introdução e uma estrofe paródica – e melhores letras já escritas) a uma certa “It Was Written In The Stars”, suas mais de 800 canções configuram uma produção marcada mais pela personalidade que pela pessoalidade (tudo foi feito para trilhas da Broadway e Hollywood) e uma obra que excede em quantidade e qualidade. Cole Porter não tem fim.