Arquivo da categoria: Canções

Mirante


de “Tubarões Voadores”, de Arrigo Barnabé

2000_Arrigo_Barnabe_Tubaroes_voadores_1024

Que eco e em que século?
Qual onda de som, qual sonda?
E que sinal de sim afinal
Fará chegar a mensagem do homem ao Cosmos
De não querer
Ser só um ser
A sós?

Daqui desse grande grão de
Areia azul, mirante,
Poeira do estouro estelar,
Veja agora aquilo que era a milhares
De anos-luz
E Vênus-luz
Brilhar. (*)

Pássaros na garganta


de “Pássaros na Garganta”, de Tetê Espíndola

1982_Tete_Espinola_Passaros_na_garganta_1024

No céu da minha garganta
Eu tenho ao cantar
Pássaros que quando cantam
Não posso conter
Solto o que se levanta
Do meu ser
E vou ao sol no vôo
Enquanto sôo

Mas quando num céu tão cinza
Não vejo passar
Os pássaros que extinguem
Da terra e do ar
Passo o que existe em mim
A doer
Me dou tão só ao som
Com dó e dom

E o que sinto vai contra
Quem varre as matas e arremata a terra-mãe
E me indigna a onda
De insanos atos de insensatos que não amaina

Ânsia de que a vida seja mais cheia de vida
Pelas alamedas, pelas avenidas
Em aroma cor e som –
Árvores e ares, pássaros e parques
Para todos e por todos
Preservados em cada coração

Mas quando num grito raro
Se apossa de mim
O espírito desses pássaros
Que não tem fim
Espalho pelo espaço
O que não há
Com amor e com arte
Garganta e ar

Cuiabá


de “Pássaros na Garganta”, de Tetê Espíndola

1982_Tete_Espinola_Passaros_na_garganta_1024

Vaia de arara passa pelos ares
Daqui pra ali
Fica no olhar a flutuar o leque
Do buriti

Se abre sobre a cidade verde
O céu de anil
No coração da América a terra de ócio
De sol e rio

Cuiabá
De onde se ouviu
Som de índio cantando à beira do rio

Cuiabá
De onde se vê
Cuia à beça, cabaça de cuietê

Cuiabá
Dos pacus
Dos furrundus
Dos cajus
Do João
“São” Sebastião
Da cabocla de pele queimada
De Leveger
Dos leques de palha
Talhas de São Gonçalo

Ah! Essa gente
Esse calor
Quero pra sempre
Com muito amor

Olhos de Jacaré


de “Pássaros na Garganta”, de Tetê Espíndola

1982_Tete_Espinola_Passaros_na_garganta_1024

Que imprevistos pontos de luz eram aqueles,
Que lembravam estrelas
No abismo infindo e sem fundo,
E que deslumbraram
Já no vislumbre
Meu olhar profundo?

Não, eu não estava na estrada do oeste desta vez,
Vendo o terrestre astral da cidade,
Na eletricidade em seus inúmeros lumes.
Na madrugada eu estava no Pantanal.
Sim, por que não?
Eu tava lá na beira-vazante;
Aqui nos movimentos-voôs nômades da mente.
Lá na fantasmal nitidez dos muitos
Pontos brilhantes.
No espelho d água de aguapés
Eram olhos de jacarés.

Jacaré jacaré jacaré
Jacaré jacaré jacaré jacaré
Jacaré jacaré
Jacarés

Amor e Guavira


de “Pássaros na Garganta”, de Tetê Espíndola

1982_Tete_Espinola_Passaros_na_garganta_1024

No cerrado onde o mato é grosso e a coisa é fina
Entre um cacho e um trago um moço abraça uma menina
O namoro é debaixo de uma árvore da flora
Onde ambos lambuzamos nossa cara de amora

Nesse ambiente exuberante e fruto do amor
A guavira água vira em nossa boca, ai que sabor
Língua a língua se fala a linguagem de quem beija-flor
Flor da pele que me impele assim
Ao mais louco amor
Que se faz naturalmente enfim
Seja onde for

Outros Sons

Num ritmo, num signo
Ígneo
De erres e orras
De esses e zorras
Num rito em urros
Risos, sussurros
Retecnizada
A tribo
Se desencerra
Na Terra

Rataplãs retumbantes, tantãs, tumbadoras, tambores
Sacra, sã sangração, sagra o clã em clamantes louvores

Em danças, transas, transes
Felizes e velozes
Vorazes e ferozes

Oh yeahvoé shazam!

bababadalgharaghtakamminarronnkonnbronntonnerronntuonnthunntrovarrnawnskawn […] !

Outros fins e outros trons
Outros timbres, outros tons
Outrossim outros a-tons
Outros sins e outros sons

Melro (Blackbird)

Melro no escuro a cantarolar

Abra essas asas pra voar

Todo o tempo

Você aguardava esse momento pra subir

Melro no escuro a cantarolar

Abra esses olhos pra enxergar

Todo o tempo

Você aguardava esse momento pra se abrir

Melro… Voe!

Melro… Voe!

Dentro da luz no azul da noite

*

Brackbird

(John Lennon e Paul Mccartney)

Blackbird singing in the dead of night

Take these broken wings and learn to fly

All your life

You were only waiting for this moment to arise

Blackbird singing in the dead of night

Take these sunken eyes and learn to see

All your life

You were only waiting for this moment to be free

Blackbird, fly

Blackbird, fly

Into the light of the dark black night

Blackbird, fly

Blackbird, fly

Into the light of the dark black night

Blackbird singing in the dead of night

Take these broken wings and learn to fly

All your life

You were only waiting for this moment to arise

You were only waiting for this moment to arise

You were only waiting for this moment to arise

(Composta em 1968)

Pássaro Sobre O Cerrado

Pássaro sobre o cerrado

Sua vida suave sabe o canto

E o corte sem saber

Do veneno que pode com o vento

Minar seu alimento

Ser que voa pelo ar com sol

Acima de qualquer mal

Lembrando apenas

Viver vale a pena

Um pássaro encerrado eu sinto

Alça voo consigo

Pássaro sobre o cerrado

Sua desaparição não tem nada a ver

A não ser como agora

Para o sul na lonjura azul

Alça voo consigo

Pássaro sobre o cerrado

Sua desaparição não tem nada a ver

A não ser como agora

Para o sul na lonjura azul

Caucaia

Caucaia do Alto tomara

Sua cara reserva

Não caia por terra

E os aviões aportem

Noutro cais de asfalto

Caucaia do alto tomara

Sua cara reserva

Não caia por terra

E os aviões aportem

Noutro cais de asfalto

Cipós, pica-paus e serrapilheira

Represa, floresta, beleza nativa

É preciso ver que isso tudo

A duras penas dança, gira e gera vida

Apenas pura

Caucaia do alto tomara

Sua rara mancha derradeira

Na região não caia na mão

Das empreiteiras

Cipós, pica-paus e serrapilheira

Represa, floresta, beleza nativa

Pode parecer brincadeira

Mas isso tudo é tão bom

Como também é o avião

Na Catarata

Eu sou um bicho pequeno aqui na rocha

Eu tenho a terra e não penso em doma-la

A roça grande é um mundo de raiz

Gerando sangue, muito verde por aqui

Tudo de bom

Tá parado no musgo

Tá mexendo nas folhas

Volando com las maripossas ai, ai!

E no som da catarata

Laraiá laraiá laiá, laraiá laiá, laraiá laiá

Eu sou um bicho grudado aqui na rocha

De carrapicho de monte nas botas

Eu tenho o braço estendido para mata

Olhando as coisas sem saber de nada

Tudo de bom tá parado no musgo

Tá mexendo nas folhas

Volando com las mariposas ai, ai!

E no som da catarata

laraiá laraiá laiá, laraiá laiá, laraiá laiá

Curva do Rio

Era noite e sentamos na curva do rio
Como num sonho perdido eu vi de quem era filho

Calma iluminavam as nuvens tranquilas
E a sinfonia de grilos por ali

Matos, murmúrios e um canto índio em mim
Na areia branca

Mergulhei uma hora nas águas do rio
Na densa correnteza reluzindo
Em nados e risos, e risos
Rios, rios, rios…

Rio tranquilo, arrepio de frio
Gosto primitivo no corpo do rio
Rio infinito
Rio infinito
Rio infinito…

Mergulhei uma hora nas águas do rio
Na densa correnteza reluzindo
Em nados, em nados, e risos, e risos
Rio!


Rio tranquilo, arrepio de frio
Gosto primitivo no corpo do rio
Rio infinito
Rio, rio infinito, rio!

*

Composta em meados dos anos 1970